Nasço amanhã
Ando onde há espaço:
– Meu tempo é quando.
Vinicius de Moraes
O Indumentária ficou quieto por algumas semanas. O que na internet, significa uma eternidade. Então vamos dizer que estamos recomeçando do zero.
E isso é bom.
Eu não tirava férias há muito tempo. Ou talvez, nunca as tenha tirado.
Sempre que viajava levava um pen drive com textos começados, uma cabeça cheia de ideias, os olhos atentos procurando sobre o que eu poderia falar e virar artigo. Dessa vez, estava sem planos, sem rumo – sem casa a maior parte do tempo, mas isso é outra história – e principalmente sem escrever.
Talvez tenha sido a brisa do mar, as caipirinhas ou a desculpa que o ano só começa depois do Carnaval, mas eu perdi o compasso. Fiquei parada.
A gente se acostuma tanto com o ritmo acelerado, que é como se não existisse nenhum outro.
Muito falamos do fast fashion, e como isso dificilmente representa nossa identidade. Já somos velhos conhecidos do termo slow fashion, que ganhou forma em 2007, quando Kate Fletcher (Centre for Sustainable Fashion, UK) o cunhou:
“O slow fashion não é uma tendência sazonal, que vem e vai, como o animal print, mas um movimento de moda sustentável que está ganhando momentum”.
Quando pensamos em artesanal, não temos pressa. Cada ponto de agulha leva o momento que precisa. Por que não moldar nosso tempo com as mãos?
Tal ideia se tornou uma filosofia e um hábito de consumo. O Slow Movement é considerado um rótulo universal para explicar os benefícios de se fazer tudo na velocidade correta: trabalhar, aprender, viajar ou até transar.
Fazer tudo um pouco mais
De
Va
Gar.
Respirou?
Vamos continuar.
Carl Honoré, autor do livro “In Praise of Slowness” (Em favor da Vagarosidade, em tradução livre) – uma das principais publicações do Slow Movement, acredita que o próximo estágio do capitalismo é consumirmos menos coisas, com maior qualidade.
“É uma revolução cultural contra a noção de que rápido é sempre melhor. A filosofia Slow não é sobre fazer tudo em um ritmo de caracol. É sobre procurar fazer tudo na velocidade correta”.
Aqui entramos na máxima de qualidade versus quantidade. Não é sobre quantas fotos, jantares, filmes ou passeios você consegue fazer, mas a experiência proporcionada de acordo com o tempo disposto.
Não estou dizendo que voltaremos para a internet discada – veja bem! Muito menos a andar de cachete ou demorar meses para atravessar o oceano de navio. E sim, que daremos tempo a cada uma das nossas histórias.
Esperar alguns minutos pela infusão do chá feito com flores naturais. Colocar os pés na grama, areia, pedras. Observar moerem os grãos de café.
Jon Kabat-Zinn, professor da Universidade de Medicina de Massachusetts, estuda os efeitos do “estar completamente consciente”, um conceito que vem do Budismo. A consciência plena é estar presente em nossos sentidos, corpo e mente. Jon acredita que tal exercício abre novas dimensões de bem-estar e integridade.
De forma mais simplória, é tirar um momento para apenas perceber você e o seu redor. Quantas vezes ficamos sem fazer nada?
E se ficamos, o quanto desse tempo passamos sentindo culpa?
Nesse espaço online, que é cheio de textos longos – bem ao contrário do que manda o figurino – queremos encontrar esse momento consciente, vez ou outra.
A última selfie assassina, o lançamento pop, a coleção de inverno…Isso tudo passa pelas nossas timelines o tempo todo. E precisamos nos atualizar. Mas não é que você vai encontrar aqui neste ano.
Aqui, praticaremos o Slow Journalism. Daremos tempo às palavras, pois só assim podemos gerar reflexão.
Fazer tudo com (c)alma
O Slow começou nos pratos dos italianos, que buscavam por mais sabor – ainda mais! Destrincharam a própria alimentação para encontrar o slow food. Indo contra as grandes cadeias alimentícias e buscando uma produção mais natural, sem tantos agrotóxicos, e cheia de bom gosto.
A partir daí, surgiu o slow fashion, slow sex e também slow travel. Trazer o Slow Movement para suas viagens é outra forma de experimentar seu destino. A ideia é viver ao invés de apenas estar.
O conceito pede por uma mente aberta às experiências, sem estar atado aos guias e obrigações. É o que transforma um turista em viajante. Deixa-se de apenas observar para engajar com os locais e descobrir a cultura da comunidade. E é claro, isso leva tempo.
As inspirações vêm de exploradores do século XIX, como Isabelle Eberhardt, suíça que se relocou a Argélia, lugar sobre o qual escrevia antes mesmo de conhecer, e quando lá esteve, mudou de nome e se inseriu completamente ao novo cotidiano.
A troca é mais profunda, pois o viajante se torna parte do local como em uma imersão. O experimento vai muito além de uma estadia e pontos turísticos. Entrar em contato com os que vivem ali é essencial, seja através das conversas numa fila de mercado, ou se candidatando a fazer trabalho voluntário em alguma ONG.
Tanto faz a atividade, o onde, o quando. A ideia é firmar os pés e abrir mais os olhos para cada momento que se passa. Pronto pra diminuir o ritmo?
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